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ARTISTAS SÃO DE VÊNUS: CONVERSA COM LUISA DALÉ

O registro de uma trajetória de descobertas.


Foto"Waves" de Luisa por Mariana Veil.


Luisa Dalé é fotógrafa e diretora de fotografia. Nascida em Brasília, no Distrito Federal, ela se formou em História, pela Universidade de Brasília, e encerrou o curso com menção honrosa por sua monografia "Os Escravos de Debret - Cores, formas e historicidade". Na área acadêmica, a artista ainda seguiu com a pós-graduação em Bens Culturais: Economia, Cultura e Gestão, pela FGV, a formação em Fotografia, pela Escola Panamericana de Arte e Design, e o mestrado em Direção de Fotografia, pela Escola Superior de Cinema e Audiovisual da Catalunha, em Barcelona, na Espanha.


Hoje, Luisa, além de fotografar, faz filmes e escreve. Ela vive e trabalha na ponte aérea entre as cidades de São Paulo (SP) e Brasília (DF).


Em entrevista com o projeto ARTISTAS SÃO DE VÊNUS: Da Gestação ao Empoderamento, a fotógrafa fala sobre sua trajetória, a forma como enxerga sua arte e seu papel como mulher. Confira a seguir.


Conte como foi sua trajetória no mundo da fotografia. Desde quando você fotografa?

Há pouco tempo descobri umas fotos que fiz da minha tia grávida, quando eu tinha 9 anos. Fiquei impressionada como com 9 anos eu já tinha despertado esse interesse pelo documentar - não que as fotos estivessem belíssimas, mas segundo ela, partiu de mim a iniciativa de fotografar. Muitos anos depois eu fui morar em São Paulo (eu sou de Brasília), fazer uma pós-graduação em Economia da Cultura, que era só aos sábados. Ou seja, eu tinha muito tempo livre no resto da semana e precisava também encontrar uma forma de sustentar, eu tinha 21 anos à época. Comecei fazendo um curso de maquiagem com a Vanessa Rozan e logo fui trabalhar de assistente de maquiagem no cinema e na publicidade. Descobri que meu interesse maior ainda não era aquele e um dia encontrei uma câmera analógica antiga na casa dos meus pais e a levei para consertar numa loja em Pinheiros. Lá, conheci um cara que me falou de um curso de fotografia na Escola Panamericana de Arte e Design, e como eu já tinha feito um básico introdutório na Escola São Paulo, vi que a possibilidade de fazer um curso mais aprofundado poderia ser uma boa. Cheguei lá e esse cara era meu professor. Fiz muita coisa na fotografia, desde eventos corporativos, a festinhas de criança, casamento, ensaios, moda... Nesse meio tempo fui aos poucos migrando para o vídeo, para poder trabalhar como Diretora de Fotografia no cinema. Hoje, fotografo sobretudo em analógico e médio formato porque fotografar é esse momento que eu tiro para fazer algo que seja muito meu, muito eu. Sem compromisso com clientes ou prazos. Gosto do processo quase que artesanal que é o fotografar em película, e minha maior produção atualmente é em retratos de pessoas próximas a mim e auto-retratos. Sua formação acadêmica trilhou caminhos diversos. De que forma ela te levou à fotografia?

Quando eu era mais nova eu achava que minha vida era uma loucura, num mau sentido. Hoje continuo achando que é essa loucura, mas muito bela. Acho que minha trajetória acadêmica demonstra desde cedo meu interesse em documentar, em manter viva a minha memória e a memória dos que estão à minha volta. Sou formada em História, minha monografia foi em História da Arte e já tive experiências trabalhando em galerias de arte e fiz muitos cursos e oficinas em Artes Visuais e Curadoria, além do MBA em Bens Culturais, que fiz na FGV. A fotografia é uma parte dessa minha vontade de ter registrada a minha história enquanto parte de todo esse universo e o tempo em que vivo.  Como você descreveria a fotografia na sua vida?

É minha válvula de escape, o lugar onde extravaso meus anseios por criar. Na fotografia e na escrita. Precisei percorrer esse caminho até o vídeo para entender que a fotografia é muito mais do que uma profissão, na verdade, nem mais considero uma profissão já que não vendo mais meus serviços como fotógrafa. É esse lugar sagrado, que acho difícil encontrar um valor monetário, e que me permite me entender enquanto indivíduo no mundo.

O que te motiva a fotografar?

Acho que é um pouco disso tudo que falei, mas resumindo: documentar, criar e transformar à partir disto que considero o documento fotográfico.  Como funciona o seu processo criativo? Qual o significado dele para você?

Essa pergunta é difícil. É bem recente isso de eu conseguir discernir como se dá meu processo criativo, e acredito que tampouco esse processo seja uma receita de bolo infalível. O processo é mutável e é isso que me estimula a criar, a buscar formas de expressão através da fotografia. Meu processo depende do quão aflorada está essa minha "vontade de arte" (kunstwöllen), eu dou muito valor à minha intuição e ao que vem como resultado dos meus sentimentos. Minha fotografia não é mental, não é milimetricamente calculada e construída, ela é um belo reflexo do muito que sou: interessada por muitos assuntos diferentes, interessada na busca pelo estético mas o estético não como um fim em si, como parte de uma história. Minha fotografia é também um pouco melancólica e contrastada, gosto de ver fotos que fiz e me enxergar nelas. Se não me enxergo, por mais bonitas que possam ser, não valem muito pra mim.  Se pudesse escolher um único momento para fotografar, qual seria?

Todo encontro que eu tiver com alguém, ou alguéns, que me interessem como seres humanos.

Foto por Luisa Dalé / Série "Encontro" (realizada durante a pandemia).

Você acredita que a fotografia pode transformar as pessoas? De que forma? Fotografia é linguagem, é comunicação visual, é imagem, que se vê com os olhos - possivelmente o sentido a que mais atribuímos valor. "Ver para crer". Acho que por um lado isso é bom, por outro, acredito que perdemos muito em não atribuir o mesmo valor aos nossos outros sentidos. Poder sentir é ter a certeza que se está vivo. Uma fotografia tem o poder de fazer sentir, até quem não pode ver. Imagina só que momento bonito é poder descrever uma bela imagem para alguém que não possa vê-la com os olhos?  A fotografia é memória, é ter a possibilidade eterna de sentir momentos e pessoas que já se foram.  A fotografia é denúncia. É instigar pessoas, sociedades, a se movimentarem em prol de algo que só pôde ser mostrado ao mundo porque houve um registro fotográfico.  Ah, são muitos os potenciais de transformação da fotografia, enquanto auto-retrato por exemplo, me possibilita uma jornada mais interior ao meu eu. Enfim... Pra você, qual a relevância da fotografia para a sociedade e na história dela?

É a prova de que a humanidade passou pela Terra. Como é ser mulher em no universo da fotografia, ainda muito predominado pela figura masculina? Já sofreu algum tipo de preconceito por conta disso?

Enquanto mulher branca, pertencente a uma classe social privilegiada, tenho consciência de que o que passei e passo às vezes ainda é mais atenuado do que, por exemplo, uma mulher preta periférica que também seja fotógrafa. Mas sim, especialmente no universo do audiovisual, a figura da mulher como diretora de fotografia ainda é muito escassa nas produções, tanto na publicidade como no cinema. Isso vem mudando com mais intensidade, eu diria, de uns 5 anos pra cá, somente. Nós ainda somos muito chamadas para fazer trabalhos "de mulher", para trazer um "olhar feminino": uma propaganda de absorvente ou um filme sobre violência contra a  mulher, por exemplo. Não tem problema nenhum, o problema é não ser chamada para outros trabalhos porque são tidos como "de homem", ou porque eles estão atuando na área há muito mais tempo que a maioria de nós mulheres, e acabam por não nos chamarem para trabalhos maiores, que somos sim 100% capacitadas para fazer. Não existe um "olhar feminino",  existem olhares diversos, que vão muito além do já estabelecido e tido como "normal", olhar do homem branco cisgênero de classe alta, provavelmente heterossexual. Faltam só esses homens perceberem que o mundo não gira em torno desse olhar deles, o resto do mundo já percebeu.  Na sua opinião, qual é o papel da mulher na Fotografia?

É contribuir na luta contra os padrões imagéticos, tanto na imagem em si quanto em quem produz a imagem. Nós todos temos a responsabilidade social de trabalharmos com equipes mistas (em termos de raça, gênero e classe social) e estarmos cada vez mais atentos para que tipo de imagem estamos produzindo. Nos perguntando sempre: o que essa imagem comunica? Pra onde vai essa imagem? Qual o contexto dela e o que acontece se ela for levada para outro contexto? Somos responsáveis por tudo o que criamos. 


Reel Cinematográfico da artista.


Durante o período de quarentena, Luisa desenvolveu a série "Encontro", que reúne retratos de seus encontros com amigos, respeitando os critérios de distanciamento social e o uso de máscaras. Com muita sensibilidade, a fotógrafa capta a essência desse encontro e propõe que seus amigos também a fotografem de forma livre, criando um plano e contra-plano do momento. Os registros podem ser encontrados no Instagram da artista. Não deixe de conferir! ♥︎


Acompanhe e apoie o trabalho dessa artista incrível através das redes:


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