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Dona Ivone Lara: a rainha do samba

Os percalços da mulher que contribuiu com a história do samba e da saúde mental no Brasil.


Foto por Guto Costa.


Dona Ivone de Lara (1921-2018) foi cantora, compositora e instrumentista brasileira. É conhecida como a Rainha do Samba e considerada um ícone na história do samba brasileiro. Ela foi a primeira mulher a integrar a ala de compositores de uma Escola de Samba e se destacava pela sua musicalidade particular. Além do seu talento natural, a artista também foi uma importante contribuição na área de Terapia Ocupacional, dedicando anos da sua vida ao Serviço Nacional de Doenças Mentais, ao lado da doutora Nise da Silveira, que revolucionou o tratamento psiquiátrico no Brasil.


Nascida no bairro de Botafogo, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), Ivone Lara da Costa, filha da cantora Dona Emerentina e de João da Silva Lara, mecânico de bicicletas, violonista e integrante do Bloco dos Africanos, desce muito cedo, é influenciada pelo ambiente familiar que valoriza a música. Aos seis anos, no entanto, fica órfã de pai e mãe e estuda no internato do Colégio Municipal Orsina da Fonseca, na Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro, onde permaneceu até seus 16 anos e teve aulas de música erudita.


Aos 12 anos, a artista foi presenteada com um pássaro da espécie "Tiê-sangue", que nomeia com a expressão moçambicana "Oialá-oxa"como herança da sua avó. Estes foram os elementos necessários para inspirar Ivone em sua primeira composição, em parceria com seus primos Hélio e Fuleiro.


Anos mais tarde, ao sair da escola, ela muda-se para a casa de seu tio Dionísio Bento da Silva, que tocava violão de sete cordas e fazia parte de grupo de chorões. Foi com ele que Ivone aprendeu a tocar cavaquinho. Na mesma ocasião, ela se inscreve na Escola de Enfermagem Alfredo Pinto e recebe uma bolsa para estudar e ajudar no sustento da casa. Em 1943, Ivone, já formada, chega a exercer a função de plantonista de emergência. Mas seu amor pela música segue firme e ela continua participando das rodas de choro organizadas pelo tio.


Em 1945, a artista muda-se para Madureira, começa a frequentar a Escola de Samba Prazer da Serrinha e a compor sambas. Todavia, muitas de suas composições foram apresentadas pelo primo Fuleiro como se fossem autoria dele, já que o sistema não favorecia a aceitação da mulher no samba. No mesmo ano, Ivone decide fazer o curso de assistência social. Em 1947, formada, ela atua no Instituto de Psiquiatria do Engenho de Dentro, onde permanece por 30 anos e se aposenta. Neste período, ela se especializou na área de terapia ocupacional e trabalhou ao lado da doutora Nise da Silveira (1905-1999) no Serviço Nacional de Doenças Mentais. No mesmo ano, ela casou-se com Oscar Costa, filho de Alfredo Costa, presidente da Escola de Samba Prazer da Serrinha, onde aprimorou suas habilidades como sambista e compôs o samba “Nasci para sofrer”.


Ultrapassando as barreiras do machismo, Ivone se tornou a primeira mulher a integrar a Ala de Compositores da Escola de Samba Império Serrano em 1965. Ao lado de Silas de Oliveira e Bacalhau, compôs o clássico samba-enredo "Os cinco bailes tradicionais da história do Rio". Três anos depois, ela também passa a desfilar na ala das baianas da escola. E até o final da década de 1960, sua atuação artística se restringia à comunidade carnavalesca, porém seu público começa a expandir com as apresentações nas rodas de samba do teatro Opinião, em Copacabana (RJ).


Em 1970, a cantora adota o nome artístico de Dona Ivone Lara e grava seu primeiro disco pela gravadora Copacabana Sambão 70. A partir daí, passa a ser reconhecida pela crítica e é considerada uma das melhores compositoras de samba do país. Quatro anos mais tarde, seu disco "Samba minha verdade, samba minha raiz" é lançado e ela faz seu primeiro show solo.


No ano de 1977, Dona Ivone se aposenta das suas funções no hospital e passa a se dedicar exclusivamente à sua carreira artística. Nesse período, suas músicas passam a ser gravadas por outros artistas e seu reconhecimento vem através de premiações, como o prêmio Sharp de melhor música do ano com "Sonho meu".


As décadas seguintes, como artista consolidada e reconhecida que se tornou, Dona Ivone seguiu compondo, lançando obras importantes, como Axé de Langa (Pai Maior,1980) e Roda de Samba pra Salvador (1982), recebendo homenagens e reconhecimento em premiações, como Prêmio da Academia Charles Cros, em Paris, na França, e Prêmio da Música Brasileira, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, e se apresentando em festivais e show por diversos países, como França, Estados Unidos, Ghana, Suíça e Japão.


Em 1999, Dona Ivone conhece Bruno Castro, seu novo parceiro, com quem anos mais tarde, lança o CD Nas escritas na vida (2010). Em 2011, ao completar 90 anos, dentre os eventos comemorativos, foi lançado seu site oficial com o apoio da Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro. No ano seguinte, a cantora se tornou enredo da Escola e Samba Império Serrano no Carnaval e, alguns meses depois, lançou seu CD “BAÚ DA DONA IVONE” com músicas inéditas e participação de grandes nomes da MPB, como Beth Carvalho, Caetano Veloso, Diogo Nogueira, Maria Bethânia, entre outros. Este foi um projeto patrocinado pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, com o intuito de distribuir o CD nas Escolas da Rede Municipal.


Em abril de 2018, aos 97 anos, Dona Ivone Lara falece em decorrência de um quadro de insuficiência cardiorrespiratória, deixando um legado importantíssimo para a história do samba brasileiro. Após sua partida, diversas homenagens foram realizadas para a artista e, em 2019, um musical que conta sua história foi lançado.



Homenagem do cartunista Carlos Latuff à artista.


O pioneirismo de Dona Ivone Lara foi essencial para abrir portas para mulheres no samba, que ainda hoje é um lugar dominado pela figura masculina. A forma como levou a sua vida e sua jornada dupla de trabalho é uma grande inspiração e prova de que uma profissão não nos define. E sua contribuição para a saúde e cultura desse país deve ser sempre lembrada, reconhecida e aclamada. Viva, Dona Ivone Lara! ♥︎


Conheça mais sobre a artista em:


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